Obra produzida pela designer e pesquisadora de desenvolvimento local e economia criativa Andrea Lacerda revela importância histórica, social e afetiva do edifício por meio de entrevistas, imagens e textos inéditos; lançamento também marca início do projeto Olhar BH
Prestes a completar 60 anos, a Galeria Ouvidor é um ícone da história de Belo Horizonte e está presente na rotina de milhares de pessoas que por lá passam, e vão para comprar de tudo, consertar roupas, buscar peças em lojas de bijouterias e armarinhos ou para tomar um cafezinho e comer um pastel. A importância social e afetiva do conjunto de lojas é revelada pelo projeto gráfico-editorial concebido pela designer Andrea Lacerda em um livro cujo título tem o mesmo nome do espaço.
O lançamento da obra acontecerá em duas datas: no dia 12 de maio, às 16h, na Livraria Ler, localizada na Galeria Ouvidor e, posteriormente, no dia 15 de maio, às 10h, no Made in Beagá, loja localizada no Mercado Novo.
O processo de elaboração do livro começou em 2008 quando Andrea apresentou seu trabalho para conclusão de curso de Design Gráfico pela Escola de Design da Universidade Estadual de Minas Gerais. De lá para cá, a designer aprimorou o projeto e seus respectivos objetivos e, em seguida, aprovou a concretização da obra pela Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte.
Embora tenha como objetivo a documentação do local por meio de pesquisa historiográfica, com registros como imagens, textos e entrevistas, o livro revela a importância social e histórica do espaço ao evidenciar a multiplicidade e a diversidade presentes no dia a dia, bem como a formação de um espaço de interações afetivas. Além de também ratificar que a construção da galeria, no início da década de 1960, dialoga com as transformações do centro de Belo Horizonte.
As entrevistas que também fazem parte do livro evidenciam a importância da Galeria Ouvidor para a memória afetiva da cidade. Os discursos de comerciantes e frequentadores – chamados de personagens – que há décadas estão presentes no local – evocam lembranças, histórias e carinho. “Muitos dos meus clientes eu comecei cortando os cabelos dos avós, dos pais e hoje corto dos filhos”, conta Nero Almeida, que possui um salão há mais de 51 na galeria.
Já Fátima Xavier, proprietária do armarinho Loja Xavier, relembra que ali ficavam as melhores lojas, um dos pontos mais movimentados da cidade. Ela frequenta o local desde a inauguração e é filha do dono da primeira loja de vinil instalada no espaço. A mãe de Fátima foi síndica do estabelecimento e responsável por retirar boates e restaurantes de lá. “Não combinava com o propósito do local, que era muito família”, comenta.
O projeto gráfico é parte fundamental do livro e, por isso, todo planejamento e detalhes foram pensados de maneira a retratar aspectos que dialoguem com a Galeria Ouvidor. Cores, elementos visuais, uma laminação holográfica 3D na capa e a lombada com costura aparente se entrelaçam e refletem as características da essência do local. Somado a isso, o grid modular no qual padrões geométricos, o texto e as imagens podem se encaixar e expandir, nasceu das principais características da arquitetura modernista do prédio. As fotografias complementam o projeto de forma ímpar ao mostrar o percurso histórico, detalhes arquitetônicos e culturais.
Vale ressaltar que o resultado final representa um esforço de uma equipe multidisciplinar, que contou com jornalistas, fotógrafos, designer, webdesigners e videomarker. Esse conjunto de olhares apresentados no livro, por fim, revela que o edifício histórico de Belo Horizonte atravessa as décadas modificando-se, atualizando-se em certos aspectos e se mantendo constante, em outros. Uma dicotomia entendida como uma bela e poética definição para a Galeria Ouvidor e toda sua trajetória na memória dos belo-horizontinos.
O resultado da pesquisa apresentada no livro é complementada por um minidocumentário que mostra entrevistas com donos de lojas e comerciantes ressaltando a história e o cotidiano da galeria ao destacar a visão dos personagens sobre o espaço. Realizado por Mirela Persichini (Samambaia), a obra audiovisual será lançada posteriormente.
O projeto Olhar BH tem como objetivo contribuir para a documentação e difusão da memória de lugares emblemáticos e históricos da região central de Belo Horizonte e, dessa forma, desvelar a identidade desses locais. O livro “Galeria Ouvidor”, de Andrea Lacerda, é o primeiro da coleção.
Este projeto tem o patrocínio do Uni-BH e é realizado com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte.
Breve história da Galeria Ouvidor
Fundada em 10 de março de 1964, a Galeria Ouvidor é um complexo arquitetônico que abriga diversas lojas no centro de Belo Horizonte. O nome foi uma homenagem à movimentada rua Ouvidor, localizada no Rio de Janeiro. À época, a construção de centros comerciais e shoppings centers remetiam ao desenvolvimento socioeconômico e à sofisticação das grandes cidades brasileiras.
A Galeria Ouvidor, no entanto, também se destacou por sua arquitetura modernista, fez parte do movimento de verticalização do centro da capital mineira e surpreendeu a todos com grandes vãos, organização modular e entradas para ventilação.
Atualmente possui seis pisos (três a mais que no início) e, ao contrário do glamour dos primeiros tempos, é um centro de comércio popular cujos números impressionam: são 200 unidades comerciais distribuídas nos seis pavimentos pelos quais circulam entre 40 e 45 mil pessoas diariamente. No mês de dezembro, esse número pode chegar a 80 mil. O número de empregados e empresários é de aproximadamente 1.400 pessoas e os ramos de atividades totalizam quase 50 categorias, entre elas alfaiataria, aluguel de roupas, armarinho, escola de informática, sex shop, estúdio de tatuagem, etc.