Taxa de participação feminina no mercado de trabalho saltou de 34,8% em 1990 para 52,2% em 2023, segundo Ministério do Trabalho

O mês de março faz homenagens às mulheres e é marcado pelo Dia Internacional delas, celebrado no último dia 8. A data oficializada pela Organização das Nações Unidas (ONU) no ano de 1975, remonta há mais de um século, tornando-se um marco para o reconhecimento dos direitos das mulheres. Apesar de trazer visibilidade para as mais diversas lutas femininas, a celebração surgiu através de um movimento operário que, ainda nas primeiras décadas do século XIX, buscava melhores condições para as mulheres no mercado de trabalho. 

Caminhando na linha do tempo, a presença feminina cresce gradualmente em diversas áreas da economia. Desde a conquista de direitos como o voto e o acesso à educação, o papel da mulher na sociedade foi remodelado, garantindo novas liberdades e possibilidades. Não por acaso, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o número de mulheres escolarizadas é superior ao de homens: 21,3% das mulheres com 25 anos ou mais têm ensino superior, contra apenas 16,8% dos homens. 

Na outra ponta, segundo dados de 2023 do Ministério do Trabalho, as mulheres predominam em setores como educação, saúde humana e serviços sociais, somando cerca de 10 milhões de trabalhadoras. No setor de serviços domésticos, as mulheres são mais de 5,5 milhões, superando os homens em número de ocupações. Apesar das evidências de que as mulheres ainda estão concentradas em segmentos historicamente associados ao cuidado e à assistência, muitas são as personagens que marcam a evolução feminina nas mais diversas indústrias.

Para Thaynara Pimenta, coordenadora de qualidade da Somattos Engenharia, construtora especializada em imóveis de alto padrão, hoje essa transformação também é perceptível em setores historicamente ocupados por homens, como a engenharia civil. Com mais de dez anos de experiência na área, ela observa como a presença feminina tem crescido e se consolidado nos últimos anos. Entre 2012 e 2021, o número de mulheres na construção civil cresceu 52,3%, segundo o Boletim Econômico da Construção Civil. 

A experiência de Thaynara é um exemplo de como as empresas têm se tornado mais receptivas à presença feminina. Quando recebeu a proposta para ingressar na Somattos, ela estava grávida de sua segunda filha e temia que isso se tornasse um empecilho para a contratação. No entanto, sua percepção mudou logo no início do processo seletivo.”Desde o meu primeiro contato com a empresa, percebi um olhar diferenciado para a valorização da mulher. Quando fui contratada, tive o suporte necessário para me desenvolver profissionalmente sem precisar abrir mão da minha família, algo que não é possível para muitas mulheres”, explica. 

A coordenadora não deixa dúvidas que a presença feminina nos canteiros de obra tem trazido impactos positivos para o setor. Segundo ela, equipes lideradas por mulheres costumam ser mais organizadas, comprometidas com prazos, além de fomentar um ambiente de trabalho mais respeitoso e produtivo. “Toda vez que começamos uma obra eu brinco pedindo que coloquem uma mulher à frente, porque fazemos a diferença”, completa Thaynara. 

Histórias para serem contadas

Na área da comunicação, a jornalista equatoriana María José Troya, editora da Revista COSAS e com mais de 20 anos de experiência em grandes veículos de comunicação, também é uma das mulheres que testemunharam e participaram dessas mudanças. Com uma trajetória internacional marcada por bolsas de estudo na Espanha e na China, Troya sempre teve um compromisso com a valorização de histórias autênticas, especialmente aquelas que destacam o papel das mulheres na sociedade.

“Em muitos momentos, dizem que é difícil ser mulher hoje em dia. Mas acredito que é o melhor momento para ser uma mulher. Podemos escolher, aprender e podemos fazer coisas que há 20 ou 30 anos eram impensáveis”, afirma a jornalista.

Desde o início de sua carreira, Troya percebeu a necessidade de contar histórias que fossem além dos casos da imprensa tradicional e que dessem voz a personagens que realmente impactam a sociedade, especialmente mulheres empreendedoras, artistas e líderes de diferentes áreas. “Eu sempre busquei histórias que pudessem transcender o tempo. Pequenas histórias que, com os anos, mostraram-se fundamentais para o crescimento de uma pessoa, de um setor, de um país”, explica.

Mesmo vivendo em uma realidade diferente da brasileira, a jornalista define que os avanços passaram a ser perceptíveis em todo o mundo. Para Troya, o jornalismo feminino passou por mudanças expressivas ao longo dos anos: “Se olharmos para trás, percebemos que as mulheres eram limitadas a determinadas áreas dentro do jornalismo. Nos anos 1980 e 1990, era comum ver mulheres apenas apresentando a previsão do tempo ou cobrindo moda e entretenimento. Hoje, estamos em todas as editorias, ganhando prêmios, escrevendo grandes reportagens e conquistando espaço porque somos competentes, não porque somos mulheres”, destaca.

Assim como María José Troya, a brasileira Silvânia Farias dos Santos Fonseca também construiu uma trajetória de superação e conquistas. Diferente do universo da comunicação, sua jornada foi na indústria alimentícia, onde quebrou barreiras e conquistou posições que antes eram ocupadas apenas por homens.

Antes de entrar para a indústria, Silvânia trabalhava como empregada doméstica, mas queria mais para sua vida. Em 2004, conseguiu uma vaga como auxiliar de produção na Trevo Lácteos, uma das maiores indústrias de laticínios de Minas Gerais, dando início a uma carreira marcada por desafios e evolução constante. “Naquele momento, esse cargo já era uma grande conquista para mim”, relembra.

Com o tempo, foi promovida para operadora de máquina e, depois, para ferista de produção, o que lhe permitiu conhecer diversas áreas dentro da empresa.Através da nova trajetória, Silvânia pode retornar aos estudos e se tornou técnica em Gestão da Produção Industrial. Há oito anos, assumiu o cargo de supervisora de produção. “Eu nunca tinha sonhado com essa posição, mas, ao longo dos anos, fui descobrindo minha paixão pelo trabalho, pelo aprendizado e pelas conquistas”, completa. 

Realidade em transformação

Embora as mulheres tenham ampliado sua presença no mercado de trabalho, setores estratégicos como o de infraestrutura urbana ainda são marcados por uma predominância masculina, especialmente em cargos de liderança. No entanto, histórias como a de Caroline Braga, coordenadora de projetos do Instituto de Planejamento e Gestão de Cidades (IPGC), mostram que essa realidade está em transformação.

Caroline iniciou sua trajetória no IPGC em 2020 como estagiária e, desde então, construiu uma carreira sólida dentro da instituição. Hoje, lidera projetos de grande impacto, incluindo a primeira Parceria Público-Privada (PPP) de Cidade Inteligente em uma capital, Goiânia. Para ela, a presença feminina na infraestrutura tem crescido, mas ainda há desafios, sobretudo no reconhecimento e na ocupação de posições estratégicas.

Ela destaca que os projetos de infraestrutura estão intrinsecamente relacionados à administração pública, onde cargos estratégicos, como prefeitas, secretárias e gestoras, são ocupados por mulheres em número significativamente menor que por homens, tanto na esfera política quanto no funcionalismo público. A título de exemplo, segundo a Confederação Nacional dos Municípios (CNM), o número de prefeitas eleitas em 2024 representa apenas 13% dos 5.569 municípios brasileiros. 

A coordenadora ressalta que a criação de redes de apoio pode ser fundamental para a inserção e fortalecimento da presença feminina no setor. Para ela, cada vez mais as posições de liderança e a linha de frente das principais organizações precisam da presença de mulheres para evoluir. “As iniciativas de apoio a mulheres, como a Infra Woman, têm sido essenciais para fortalecer essa rede e abrir novas portas para as mulheres no setor”, completa Caroline.