Isolados em casa e distantes das pessoas devido a pandemia, os brasileiros passam cinco horas do dia usando aplicativos do celular. O neurocientista Fabiano de Abreu aponta as razões para um número tão expressivo.
Os brasileiros estão cada vez mais conectados ao celular. E isso pode explicar os sérios danos que sua saúde mental tem sofrido nos últimos tempos. Números levantados pelo App Annie mostram que os brasileiros passam cinco horas por dia usando os aplicativos de seus aparelhos, um crescimento de 30% neste número nos últimos dois anos.
Para explicar o que leva os brasileiros a ficarem tanto tempo mexendo nos aplicativos, o PhD, neurocientista, neuropsicólogo e biólogo Fabiano de Abreu lembra, antes de mais nada, que o país “é o que mais consome internet no mundo. Assim como o que mais tem solicitação de selo de verificação nas redes sociais”. Outros agravantes é que o Brasil está na cabeça de dois rankings nem um pouco agradáveis: Segundo a OMS, em 2019 foi o país mais ansioso do mundo, e o segundo do planeta em número de estresse, perdendo para os japoneses. Assim, Fabiano ressalta que o que leva as pessoas a ficarem mais tempo usando esses aplicativos é a própria ansiedade. “É essa necessidade de liberação da dopamina, neurotransmissor da recompensa, a necessidade de satisfação, sair da atmosfera negativa que a ansiedade leva. Veja que os conteúdos mais consumidos são os de comédia, enquanto temas intelectuais há menor interesse, pois há uma fadiga e um prejuízo atencional para obrigações ou temas sem interesse ou que fogem a uma solução imediata que supra a negatividade ou infelicidade”. E essa não é uma questão recente. Em 2018, Abreu publicou um artigo mostrando que a internet tem deixado as pessoas menos inteligentes, e sujeitas a essa ansiedade tão expressiva.
Soma-se a esse uso expressivo dos aplicativos até uma forma de relaxar em meio às tensões diárias: “O Brasil tem vivido uma série de problemas políticos, econômicos e sociais. As pessoas acabam somatizando isso e ficando cada vez mais ansiosas. A própria violência mantém a ansiedade sempre alta devido ao instinto pela sobrevivência. A internet tem facilitadores para a liberação da dopamina fornecendo a sensação de alívio que disfarça e “compensa” a ansiedade, mas vicia e torna-se intermitente. O uso de celulares e acesso aos aplicativos desencadeiam sensações de bem estar momentâneas, como recompensa e desvio de pensamentos negativos que a ansiedade promove”, revela o neurocientista.
Ainda assim, o neurocientista vislumbra um triste cenário pela frente para os brasileiros: “Vamos entrar em colapso com um alto número de doenças proveniente da ansiedade potencializada e constante, que se equipara ao estresse. O transtorno narcisista é um dos problemas que me preocupa, casos como agressão contra mulheres, psicopatias, posição de superioridade, negacionismo, fake news, estão relacionados”. Além disso, “a ansiedade não traz riscos apenas pela ansiedade em si relacionado ao sistema imunológico, também acarreta em perturbações, síndrome, doenças que podem levar à morte. A falta de coerência tem relação direta com essa disfunção no sistema emocional relacionado à ansiedade”, finaliza o neurocientista.