Durante a pandemia da covid-19, a Prefeitura reforçou a higienização nos pontos e nos ônibus. Foto: Claudio Vieira/PMSJC
*Fonte: Diário do Transporte
Análise sobre o risco de contaminação pelo COVID-19 no transporte público por ônibus de São José dos Campos: 5,8% das pessoas acreditam ter sido infectadas no sistema, e 2,72% dos trabalhadores da área foram infectados
Desde o início da pandemia um grande estado de alerta se instalou na população com o temor de contaminação em locais com concentração de pessoas, ou aglomeração para os mais alarmistas, nas cidades ao redor do mundo.
Esse estado de alerta, ou semi-pânico, levou a vários questionamentos e incertezas por parte da população com relação ao risco de contaminação no transporte público. Tal estado de alerta e preocupação foi cada vez mais agravado pela forma, muitas vezes irresponsável, que a imprensa e os órgãos de controle se manifestavam publicamente.
O transporte público por ônibus é projetado para circular nos horários de pico com seis passageiros por metro quadrado, podendo chegar, em cidades como a capital São Paulo, a nove passageiros por metro quadrado. É um sistema que por si só se baseia na concentração de pessoas para garantir sua viabilidade econômica-financeira, pois sua essência é ser coletivo e não individual.
Ser coletivo e continuar assim é fundamental para a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do sistema de transporte e da qualidade de vida da população, principalmente no que se refere à gestão do espaço público e emissão de poluentes. Um ônibus convencional com dois terços de sua lotação transporta 57 pessoas ocupando um espaço de 50 metros quadrados, sendo que essas mesmas pessoas transportadas em automóveis, e considerando a média de utilização de 1,2 pessoas por automóvel, precisariam de 48 carros para serem transportadas ocupando mais de 1.000 metros quadrados de espaço público!
Assim, acreditar que é possível praticar o distanciamento social de 1,5 metros entre as pessoas dentro de um transporte coletivo é uma imensa utopia, bem como é uma imensa demagogia um gestor público tentar decretar que nos ônibus só serão transportadas pessoas sentadas. Além de não atender ao critério de distanciamento social ao colocar todos os passageiros sentados, é operacionalmente impossível garantir tal requisito operacional.
Mas se é impossível garantir o distanciamento social no transporte público, como é possível manter a operação desse serviço que é essencial e primordial para o funcionamento das cidades?
Em São José dos Campos – SP, assim como em várias outras cidades, foram adotadas diversas ações para a manutenção do funcionamento do transporte público de forma a garantir a segurança dos passageiros e trabalhadores do sistema. É importante salientar que as ações não se limitaram ao poder público. A participação das empresas operadoras, do sindicato dos trabalhadores do sistema e da própria população foi fundamental para os bons resultados obtidos.
Como forma de auferir o resultado desse conjunto de ações, a Secretaria de Saúde e o Instituto de Pesquisa e Planejamento de São José dos Campos elaboraram uma pesquisa abrangendo pessoas infectadas pelo COVID-19 na cidade.
A PESQUISA
A pesquisa foi realizada entre os dias 22 e 24 de julho de 2020, e teve como base a metodologia de ligações telefônicas com utilização de questionário estruturado, tendo como público alvo munícipes contaminados e recuperados do COVID-19 em São José dos Campos. A cidade possui cerca de 730.000 habitantes, e a amostra utilizada foi de 515 entrevistados, sendo 51% mulheres e 49% homens com faixa etária predominante entre 27 e 77 anos de idade, sorteados de forma aleatória em um universo de 3.258 cadastrados.
Dos 515 entrevistados, 178 declararam ser passageiros do transporte público, correspondendo a 35% dos entrevistados. Este é o primeiro indicador de que o transporte público não é o principal fator de transmissão do COVID-19 na cidade.
Mas é importante lembrar que mesmo aqueles que são passageiros frequentes do transporte público podem acabar tendo contato com outras fontes de contaminação, como a sua própria casa por meio de familiares e pessoas a qual convivem e que por ventura possam ser assintomáticos, ambiente de trabalho, locais públicos, entre outros.
Quando perguntado ao grupo de pessoas que são passageiros frequentes dos ônibus se eles acreditavam ter sido contaminados durante a utilização do transporte público, apenas 30 entrevistados, ou 17% desse grupo, responderam que sim.
Isso significa que apenas 5,8% dos entrevistados na pesquisa acreditam que podem ter sido contaminados pelo COVID-19 no transporte público.
Em uma verificação paralela junto à medicina do trabalho das três empresas operadoras do transporte público por ônibus na cidade, foi verificado que dos 1.765 trabalhadores registrados no sistema, que possui uma frota de 389 ônibus em circulação, até dia 31/07 de 2020 apenas 48 colaboradores haviam sido infectados pela doença, representando o baixo percentual de 2,72% não tendo sido registrada nenhuma morte até essa data.
AS AÇÕES DE SEGURANÇA
Dentre as várias ações adotadas, podemos elencar as principais:
- Vacinação contra o vírus H1N1 para todos os trabalhadores do sistema;
- Afastamento dos funcionários pertencentes ao grupo de risco (maiores de 60 anos e pessoas com comorbidades);
- Capacitação dos trabalhadores do sistema para atuarem como agentes multiplicadores de informações sobre prevenção;
- Distribuição de EPIs (máscaras e álcool em gel individual) para todos os trabalhadores do sistema;
- Distribuição gratuita de 100.000 máscaras para os passageiros do sistema;
- Implementação da obrigatoriedade do uso de máscaras dentro do transporte coletivo;
- Higienização dos ônibus com produtos sanitizantes todas as noites na garagem, e a cada ciclo de viagem durante a parada técnica nos terminais e estações;
- Higienização dos pontos de parada, estações e terminais duas vezes por semana, com produtos sanitizantes de durabilidade superior a sete dias de efeito de proteção;
- Implantação de dispensadores de álcool em gel em todos os ônibus da frota, terminais e estações;
- Implantação de sinalização e cartazes educativos indicando os cuidados de proteção individual contra o COVID-19;
- Acompanhamento em tempo real dos dados operacionais do sistema por meio do GPS e bilhetagem eletrônica, monitorando os indicadores de reclamações de superlotação, análise de oferta x demanda, e pesquisa de carregamento visual;
- Intervenções operacionais diárias para reforço pontual nas linhas em que são detectadas viagens com carregamento superior a 80 passageiros (a capacidade dos ônibus convencionais é de 86 passageiros, mas uma viagem pode levar até 170 passageiros dependendo do seu índice de renovação);
- Determinação, por Decreto Municipal, para que empresas com mais de 40 funcionários realizem escalonamento dos horários dos funcionários para distribuir a demanda no transporte público e reduzir a incidência no horário de pico.
Com as medidas adotadas acima, atualmente o sistema de transporte público de São José dos Campos oferece diariamente 72% da frota disponível transportando 47% da demanda típica (dados de dias úteis). Durante os primeiros 129 dias de quarentena foram realizadas 20.017 pesquisas de carregamento visual, registrando 89,3% das viagens com níveis A, B e C de serviço (Nível C = todos sentados, poucos em pé).
São 101 linhas em operação, sendo que na quarentena 57 linhas não tiveram nenhuma reclamação a respeito de superlotação. Neste período foram registradas 3,2 reclamações para cada 100.000 passageiros transportados, ou 2,86 reclamações por dia para 89.393 passageiros transportados diariamente (média incluindo finais de semana e feriados).
Adotando os cuidados necessários, e principalmente compartilhando a responsabilidade pela segurança de cada um entre o poder público, a iniciativa privada e a sociedade civil, é possível promover a manutenção de um transporte público seguro e de qualidade para a população, para que a cidade continue funcionando e consiga superar esse momento tão atípico e grave que todo o mundo está vivendo.
Eng. Paulo Guimarães – Secretário de Mobilidade Urbana de São José dos Campos, Vice-presidente do Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes Públicos de Mobilidade Urbana