Maristela Bretas
A história por trás da morte mais polêmica do país dos últimos 30 anos chega hoje aos cinemas brasileiros e serve como exemplo de como a manipulação política e o ego excessivo de uma equipe médica transformaram a vida de um grande estadista em um sofrimento infindável. “O Paciente – O Caso Tancredo Neves”, sob a direção de Sérgio Rezende, é baseado no livro homônimo, do historiador Luis Mir.
O filme revela, após 30 anos, os bastidores médicos dos últimos dias da vida do primeiro presidente civil, eleito pelo colégio eleitoral no Congresso Nacional, pós-ditadura militar. Depois de 39 dias de internação e uma sucessão de avaliações e procedimentos médicos errados, Tancredo Neves morreu no dia 21 de abril de 1985, sem nunca ter sido empossado.
Com interpretação comovente do experiente Othon Bastos, a produção reforça a ansiedade do presidente eleito com o destino da nação, caso não tomasse posse, suas angústias e o medo do retorno da ditadura militar que não daria posse a seu vice, José Sarney. A produção relembra frases e discursos marcantes do político, sempre reforçando que ele precisava melhorar e tomar posse na Presidência para garantir a democracia no país. Mas a que mais emociona é quando ele diz “Eu não merecia isso”. Othon Bastos faz arrepiar.
Sérgio Rezende (responsável por sucessos como “Em Nome da Lei”, “Zuzu Angel” e “O Homem da Capa Preta”) soube captar muito bem a história literária, pesquisada por anos por Luiz Mir. Em entrevista na pré-estreia especial em Belo Horizonte, no Cineart Boulevard, o diretor chamou Tancredo Neves de conciliador. “Depois de 21 anos de ditadura, era o único homem capaz de reunir as forças políticas e resinstaurar a democracia. Eu acho que neste momento radical que o país está vivendo, nós precisamos de alguém com equilíbrio que some no lugar de dividir”.
Esta é a terceira parceria de Rezende com o ator Othon Bastos. “Ele é um monumento, um ator que está vivo criativamente, que comove a equipe inteira, movimenta o set de filmagem e é sempre um privilégio trabalhar com ele”, declarou.
Othon Bastos, também presente à pré-estreia, contou que foi muito emocionante interpretar o político porque pegou esse momento da vida dele que o destino mudou. “Quando a gente não completa o que faz na vida, a gente diz que foi destino. Foi uma perda enorme, eu acho que o Tancredo faz uma falta enorme nesse país, uma pessoa digna, um grande político. Foi um prazer enorme interpretá-lo. Hoje não existe um grande político no país, nós estamos vivendo o momento da pusilanimidade, da covardia, da fraqueza”.
Também brilhou na produção a atriz Esther Góes, no papel de Risoleta Neves, esposa de Tancredo, A personagem foi apresentada como uma mulher forte, que ficou ao lado do marido durante a vida toda e que exercia grande influência em suas decisões. O elenco conta ainda com Paulo Betti, como o vaidoso e insensível médico Henrique Pinotti (último a operar o presidente), Otávio Muller (Dr. Renault), Leonardo Medeiros, (Dr. Pinheiro Rocha, primeiro a operar Tancredo), Emiliano Queiróz (médico da família) e Emílio Dantas, como o assessor de imprensa Antônio Britto, papel bem fraquinho se comparado ao que representou o jornalista na ocasião dos eventos.
Com rápida reconstituição de época, utilizando o recurso de imagens da passagem da ditadura militar, a escolha pelo Colégio Eleitoral, o povo nas ruas pedindo democracia e rezando para que o presidente melhorasse. “o Paciente – O Caso Tancredo Neves” é uma aula de história de um momento delicado do país. A abordagem principal é a doença que atingiu o político às vésperas de sua posse e toda a sequência de diagnósticos duvidosos, de egos médicos inflados (quem ia ser o herói que salvaria o presidente) e de interesses políticos (situação e oposição).
Um “E.R” brasileiro, com direito a levar o presidente para o Pronto Socorro do Hospital de Base de Brasília porque todo mundo dava ordem, mas não sabia o certo a fazer. Tancredo foi o político que conseguiu unir uma nação, mas virou um joguete nos últimos dias de sua vida. Um bom exemplo foi a famosa foto posada numa sala do hospital escondendo os aparelhos para mostrar ao país que o presidente eleito estava bem seria empossado.
“O Paciente – O Caso Tancredo Neves” é uma aula de história que deve ser conferida pela nova geração que não viveu aquele momento. E também a recuperação de um momento que foi importante e mudou o país para quem viveu todo o drama na época, mas desconhecia a verdade sobre o tratamento médico dado ao presidente e ao homem Tancredo. Vale muito conferir, principalmente pelas ótimas atuações do casal principal.
Ficha técnica:
Direção: Sérgio Rezende
Produção: Globo Filmes / Morena Filmes
Distribuição: Downtown Filmes / Paris Filmes
Duração: 1h40
Gêneros: Biografia / Drama
País: Brasil
Classificação: 12 anos
Nota: 3,5 (0 a 5)